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Pessoas & Gestão

Riscos sociais, ambientais e climáticos: legal toolbox para um contencioso na indústria bancária

A abertura do capítulo "Dispute Resolution: Northeast" possui autoria de Wilson Sales Belchior, sócios do RMS Advogados

Este artigo apoia-se na ideia, compartilhada entre alguns players, de que o futuro das corporações e, principalmente, a sua contribuição positiva na sociedade dependerá de um ambiente de negócios no qual os riscos ambientais, sociais e climáticos sejam considerados nas decisões que impactam a operação, o setor e os clientes.

Não é novidade que o regulador adotou padrões ESG (Environmental, Social and Governance) para a indústria bancária brasileira. Os riscos sociais, ambientais e climáticos que provoquem impactos reais e potenciais na gestão de risco e capital[i] e possibilidade de perdas relevantes em prazos distintos[ii] integram a agenda corporativa dessa indústria através de um documento (Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática) com ações e mecanismos que visam à efetividade dessa diretriz.

Efetividade que é percebida no reporte de riscos climáticos relacionados a informações financeiras e até mesmo na adesão de players às divulgações exigidas por iniciativas dessa natureza. Resultado confirmado por um recorte de 1365 companhias em algumas indústrias, inclusive a bancária, quanto às metas do Task-Force on Climate-Related Disclosures nos anos fiscais 2020, 2021 e 2022[iii].

ESG impacta, portanto, decisões de financiamento e investimento, cujos reflexos alcançam a oferta e a demanda de capital. É o exemplo dos “ativos de sustentabilidade”, como certificados de crédito de carbono e de crédito de descarbonização, que passaram, no Brasil[iv], a ser registrados na contabilidade bancária (“Cosif”) de forma padronizada. E o reconhecimento de que o policy making em matéria ambiental influenciará o rating[v] de bancos e outras Companhias à medida em que ele influencia eventos climáticos e a transição para uma economia de baixo carbono.

Na percepção do cliente, o “Índice S&P/B3 Brasil ESG” é um bom exemplo. Empresas brasileiras são selecionadas a partir de uma Avaliação de Sustentabilidade Corporativa, que considera o atendimento aos dez princípios do Pacto Global da Nações Unidas, além de outros indicadores que avaliam aspectos sociais, ambientais e climáticos relevantes para o sucesso do negócio.

É predominantemente ambiental o cenário de riscos globais nos próximos dois (desastres naturais, falha em mitigar as mudanças climáticas, danos em larga escala, insucesso em adaptar-se às mudanças climáticas, crises de recursos naturais) e dez anos (perda de biodiversidade, colapso de ecossistemas e os demais anteriormente mencionados)[vi]. Isso materializa a exposição da indústria bancária a esses riscos, os quais terão reflexos na oferta e demanda de capital.

Os conflitos e a gestão deles não estão excluídos dessas mudanças. Compreender esses riscos significa reconhecer o surgimento de um contencioso de volume vinculado aos riscos ambientais, sociais e climáticos.

O foco precisa ser no planejamento, regulatório, operacional, mas também nos conflitos eventualmente originados no desalinhamento entre as expectativas de documentos públicos e a percepção das pessoas sobre sua efetividade. Esses conflitos podem incluir questionamentos acerca da responsabilidade de administradores, práticas corporativas, greenwashing, reputação, percepção dos usuários sobre os produtos e serviços, entre outros.

Por enquanto o foco da judicialização desse tipo de conflito é o Estado. Determinar a fiscalização de órgãos públicos quanto à adoção de práticas de ESG[vii]; questionar o incentivo com recursos públicos para empresas que não adotam práticas corporativas em linha com ESG. Contudo, a tendência é de expansão para o setor privado, inclusive na indústria bancária. Já se viu, por exemplo, a condenação de uma Companhia por supostos danos sofridos por uma comunidade autóctone. Na decisão judicial foi mencionada a necessidade de a gestão ter incorporado indicadores ESG.

Este é o momento de organizar legal toolboox com metodologia, indicadores, orientação específica e, principalmente, foco nas possibilidades de enfrentamento do contencioso ESG na indústria bancária. Ou seja, planejar (definir parâmetros de compliance; acompanhar a implementação; avaliar as mudanças; analisar os impactos) e operacionalizar (mapear os conflitos; definir estratégias e indicadores; monitorar em tempo real; reavaliar estratégias). Isto significa descobrir ameaças e desenhar modelos que mitiguem os impactos desses conflitos na oferta e demanda de capital.

 

[i] Resolução BCB n° 139 de 15/9/2021

[ii] Instrução Normativa BCB n° 153 de 15/9/2021

[iii] Task Force on Climate-related Financial Disclosures 2023 Status Report

[iv] Instrução Normativa BCB n° 325 de 21/11/2022

[v] Indicadores ESG de Crédito: Bancos da América Latina

[vi] The Global Risks Report 2023

[vii] TC 014.499/2023-1