Neste mês de junho, o Dias Teixeira Advogados completou 15 anos e, como a atuação e trajetória do escritório estão muitos conectadas à evolução tecnológica e normativa do ambiente digital, resolvemos construir uma memória das principais demandas jurídicas que impactaram o comércio eletrônico neste período.
Em 2008, quando iniciamos as atividades, as plataformas de comércio eletrônico tinham preocupações pontuais com as suas marcas, com a propriedade intelectual dos programas e sistemas que suportavam seus websites e com o Código de Defesa do Consumidor (“CDC”). Portanto, as demandas do segmento não raramente se resumiam ao registro e/ou defesa de marcas, à construção de contratos para regular os serviços prestados por desenvolvedores e à elaboração de documentos legais (i.e., termos de uso e políticas de privacidade) com o objetivo de endereçar determinadas obrigações do CDC.
A partir de 2009, começaram a surgir as chamadas “Leis de Entrega”, que por serem estaduais e estabelecerem regras e turnos muitas vezes distintos para a entrega de produtos em cada estado do país, demandaram uma rodada de ajustes nos documentos legais das plataformas e uma boa dose de adequação logística, fazendo inclusive crescer a terceirização de serviços de entrega (gerando também uma demanda deste tipo de contrato).
Contudo, foi o Decreto do Comércio Eletrônico (Decreto 7.962/2013) a primeira norma específica que realmente mudou o segmento. Ao estabelecer regras para o exercício do direito de arrependimento no âmbito do comércio eletrônico e instituir a disponibilização de informações obrigatórias aos consumidores, a nova legislação exigiu uma relevante adequação das plataformas de comércio eletrônico e dos correspondentes termos de uso, sem falar na solução de dúvidas recorrentes da época, como “Preciso assegurar o direito de arrependimento no caso de produtos de consumo instantâneo, como cursos online?”.
Uma nova mudança relevante aconteceu com o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) e seu respectivo regulamento (Decreto 8.771/2016), que, dentre outras coisas, impuseram obrigações técnicas específicas aos chamados “provedores de aplicação”, categoria que abrangia – também – as plataformas de comércio eletrônico. As novas obrigações incluíam a necessidade de obter o consentimento dos usuários para variadas situações e a guarda obrigatória dos registros de acesso às plataformas, de modo que mais uma vez houve uma forte demanda de alteração de documentos legais das plataformas, dessa vez mais concentrada nas políticas de privacidade.
Além disso, ao determinar que os provedores de aplicação (i.e., websites, plataformas etc.) mantivessem os registros de acesso, o Marco Civil da Internet desencadeou um significativo volume de medidas judiciais contra as plataformas de comércio eletrônico, visando a identificação dos responsáveis por transações fraudulentas. Em um dos casos que patrocinamos à época, trouxemos a triste notícia para o nosso cliente que, uma aquisição online e fraudulenta de telefones celulares, feita com o cartão corporativo da empresa, havia sido na verdade realizada – sem qualquer autorização – por um colaborador do cliente.
A maior demanda jurídica, todavia, ainda estava por vir. Com a publicação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13.709/2018), as plataformas precisaram passar por uma profunda jornada de adequação, mapeando a adequando todo o tratamento de dados que realizavam. Surgiu também a necessidade de construir políticas diversas, cláusulas contratuais específicas, respostas padronizadas para solicitações de usuários, plano de resposta a incidentes e toda uma gama de documentos e materiais que compunham o chamado “programa de privacidade”. Não tardou também para que o nosso escritório começasse a ser procurado para documentar e gerenciar incidentes de segurança envolvendo dados pessoais, que se tornaram cada vez mais recorrentes, bem como para prestar serviços de Encarregado / DPO as a service.
E, enquanto tudo isso acontecia, temas relativamente antigos, como a contratação adequada de influenciadores, a identificação publicitária de postagens, a necessidade de autorização para determinados formatos de promoção comercial, o combate de práticas como cybersquatting e typosquatting, a responsabilidade das plataformas de marketplace e o uso de marcas de concorrentes como palavras-chave em ferramentas de links patrocinados continuaram sendo fortemente debatidos, dentro e fora do judiciário (este último, parcialmente pacificado pelo STJ em 2022, com a publicação do acórdão do REsp 1.937.989).
Aliás, assim como a tecnologia, as demandas jurídicas não deixam de evoluir e duas delas recebem atualmente especial destaque. A primeira se refere ao uso de marcas de terceiros em plataformas como Google Adwords, que estava limitada à correspondência positiva (adoção de marca do concorrente como palavra-chave ou no título do anúncio) e agora evoluiu também para alcançar a correspondência negativa, ou seja, discute-se atualmente a necessidade de negativar / solicitar o “opt-out” das marcas de concorrentes. A segunda, envolve o uso de cookies para fins publicitários, frequentemente amparado no legítimo interesse e que, a partir do entendimento da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, manifestado em guia orientativo publicado no 2º semestre de 2022, pode – em certos casos – recomendar uma mudança de base legal para o consentimento. Estes dois assuntos, que impactam fortemente o comércio eletrônico, estão ainda em franca discussão.
Enfim, seria impossível exaurir nesta breve memória todas as demandas jurídicas do segmento de comércio eletrônico que atendemos nos nossos 15 anos de existência, mas é muito fácil perceber que a nossa atuação evoluiu e se expandiu a partir das demandas do segmento!