Disputas

Aperfeiçoamentos das reestruturações empresariais no Brasil: Conciliação e Mediação prévia ao pedido de recuperação judicial

Leonardo Costa Norat, sócio do Mendes Advocacia e Consultoria, concede entrevista exclusiva ao Decisor Brasil, na qual comenta como a reforma da Lei de Recuperações e Falências e o avanço da mediação empresarial têm reduzido o preconceito do mercado e fortalecido negociações preventivas entre empresas e credores

  1. Durante a pandemia, muitos analistas diziam esperar uma “avalanche” de recuperações judiciais no Brasil. Qual sua percepção sobre isso no momento?

Embora o número de recuperações judiciais tenha aumentado a partir de 2023, o temor de quebra do mercado pela então imaginada “avalanche” não se efetivou. Vejo até mesmo que em outros momentos de instabilidade política e econômica do país, a situação das empresas já foi mais fragilizada.

  1. Como você enxerga a visão do mercado sobre os procedimentos da Lei de Recuperações e Falências?

A meu ver, o mercado tem tido cada vez menos preconceito com empresários que recorrem aos instrumentos de insolvência. Tratar sobre o tema tem tido menos barreiras tanto de jurídicos internos, quanto dos escritórios que assessoram as companhias. Igualmente, percebe-se melhor fluxo de negociação com instituições financeiras e entes públicos, que, até pouco tempo atrás, costumavam ser menos disponíveis para abordar estes temas.

  1. Quais movimentos jurídicos foram importantes neste processo de aperfeiçoamento das reestruturações no Brasil?

Sem dúvidas, a reforma da Lei 11.101/05 pela Lei 14.112/20 foi um marco importante para modificar a percepção do mercado sobre as reestruturações empresariais, especialmente pelo fato de ter propiciado a oxigenação de discussões jurídicas sobre o tema, o aperfeiçoamento da administração judicial e positivado mecanismos econômicos já consagrados pela jurisprudência, academia e pelo mercado.

  1. Quais instrumentos você destacaria como principais a partir destes movimentos?

Se eu puder destacar três instrumentos, diria que a Conciliação e Mediação prévia ao pedido de recuperação judicial, como meio de negociação e proteção judicial para este ambiente, a previsão expressa do financiamento da devedora com tutela do financiador em caso de alienação de bens e a mudança nos modos de liquidação de ativos na falência são instrumentos que reforçam a confiança nos mecanismos previstos em lei e na condução do mercado.

  1. Você vê algum instituto ou procedimento com maior potencial de gerar efeitos positivos e concretos aos agentes?

A partir dos casos que vimos acompanhando e que temos atuado no escritório, a Conciliação e Mediação Prévias (ou incidentais) a processos de recuperação, prevista no art. 20-B, da 11.101/05 tem se mostrado adequada para negociações.

Isso se dá especialmente pela possibilidade de obtenção de uma espécie de “stay period”, a suspensão de ações e execuções pelo prazo de 60 dias e o convite de credores para negociação com o devedor neste período, na esfera dos Centros de Solução de Conflitos Empresariais dos Tribunais.

  1. Quais os critérios para que este procedimento tenha sucesso?

Pela nossa experiência, três fatores são fundamentais para o êxito: (i) organização documental do empresário que recorre à conciliação; (ii) um ambiente colaborativo e transparente entre os representantes e respectivos procuradores e (iii) realização de sessões coletivas e individuais sobre a demanda.

A organização documental será fundamental tanto para viabilizar a concessão da tutela prevista no art. 20-B, §1º, da Lei 11.101/05 quanto para demonstrar a potencialidade de se utilizar do mecanismo da recuperação judicial (procedimento que naturalmente leva mais tempo de fiscalização do Poder Judiciário e prazo de stay period).

O ambiente de transparência e a alternância de sessões coletivas e individuais diminuirá eventuais ruídos entre credores, mas ao mesmo tempo propiciará que cada um apresente suas exigências e peculiaridades, já que ainda não se estará propriamente em um contencioso concursal. Assim, o devedor tem mais autonomia, mas, ao mesmo tempo, maior campo de visão para buscar conciliar os diversos interesses, visando conferir tratamento isonômico entre os credores.

Nesse percurso, os CEJUSCs e o magistrado competente pela tutela são fundamentais para o sucesso da negociação, pois são agentes fundamentais na criação e estabilidade do ambiente de negociação durante esse prazo e, ao fim, para, sendo o caso, homologar os acordos entre devedor e credores.