favicon
Coluna: Rumo Logística

Tecnologia nas obrigações acessórias e ativos tributários – Novos tempos e velhos problemas

O artigo desta semana na coluna Rumo Logística foi escrito por Daniel Henrique Viaro, coordenador jurídico tributário, e Jennifer Michele Santos, advogada plena tributária.

O Brasil é um celeiro de mentes brilhantes, mas nem sempre o brilhantismo é direcionado em favor da sociedade. Podemos evidenciar tal fato no campo tributário-fiscal.

Tem-se uma extraordinária eficiência nos sistemas fiscais para cruzamento de dados, apontamento de malha fiscal, checagem de tributos não recolhidos ou recolhidos a menor, divergência de dados cadastrais, fiscalização de créditos tributários, o que demonstra a grande capacidade da inteligência tecnológica brasileira nesta seara.

No entanto, as dificuldades dos contribuintes para cumprimento de suas obrigações acessórias não regrediram em razão da inovação tecnológica. Pelo contrário, o cenário se tornou ainda mais desafiador em razão da multiplicidade e complexidade de sistemas adotados pelos órgãos fazendários.

O objetivo precípuo dos referidos sistemas é (ou deveria ser) simplificar as declarações e as entregas de documentos necessários à efetiva apuração e recolhimento dos tributos devidos, bem como auxiliar na rápida identificação e restituição dos valores recolhidos indevidamente ao fisco.

No entanto, o avanço tecnológico não está sendo acompanhado da sua principal finalidade: a simplificação.

Exemplifica-se. Se uma empresa possuí dez filiais no estado de São Paulo, precisará de profissionais capacitados para entrega de obrigações acessórias e manipulação dos sistemas de débitos federais (EFD, ECD, E-cac, E-Social, Regularize, etc.), de débitos estaduais (SEFAZ/SP, PGE/SP, E-credac, etc.) e, também de débitos municipais, que costumam ser completamente diferentes de um município para o outro.

Além se serem diversos, os sistemas em operação possuem interfaces distintas uns dos outros, são descontinuados e/ou substituídos por novos e, por vezes, limitam a possibilidade de atuação dos contribuintes, restringindo os atendimentos eletrônicos a poucas e burocráticas opções listadas em formulários definidos de forma unilateral, sem a menor atenção às necessidades do dia-a-dia e ao direito de petição constitucionalmente garantido.

Um claro exemplo é a situação criada após a implementação do E-Social e da consequente extinção da necessidade de entrega da obrigação acessória denominada Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED). Essa última, permitia às empresas contratantes a declaração do número de funcionários (ativos e desligados) e, com isso, maior controle sobre as obrigações tributárias, trabalhistas e previdenciárias a eles vinculadas, além de fornecer ao governo base para o pagamento de seguro desemprego e maior visibilidade para implementação e manutenção de diversos programas sociais.

Ocorre que, em que pese representar diversos avanços tecnológicos, o E-social não traz todas as informações que anteriormente eram prestadas por meio do CAGED.

Esses dados são vitais para apuração do montante de créditos tributários a serem restituídos ao contribuinte mormente no que tange aos pagamentos indevidos de tributos, em especial das rubricas de contribuições previdenciárias (como nos casos recentes em que o Supremo Tribunal Federal decidiu pela não incidência do referido tributo sobre verbas indenizatórias) e de outros tributos devidos sobre a folha de pagamentos.

Outro exemplo é a contratação de mão de obra terceirizada por meio de sindicatos (prática comum a empresas que atuam em portos, por exemplo): enquanto a pessoa jurídica contratante utiliza o E-Social para prestação de informações fiscais e previdenciárias de seus trabalhadores (nos termos do Decreto 8378/74) e o DCTF/Web para processamento das informações e geração de guia de pagamento dos tributos correlatos, os Sindicatos não estão obrigados a usar o E-Social, mas sim à entrega mensal de GFIP. Em razão de serem sistemas diversos, o resultado é a cobrança em duplicidade e, portanto, indevida de FGTS dos trabalhadores em questão, o que leva à necessidade de providencias administrativas e judiciais e, com isso, ao prejuízo do particular para regularizar débito que sequer seria constituído caso houvesse comunicação efetiva entre os diversos sistemas usados pela Receita Federal do Brasil.

Os cenários acima narrados, sem dúvida nenhuma, atrapalham a rotina administrativa de controle e cumprimento das obrigações fiscais, dificulta, e as vezes, impossibilita a apuração de créditos tributários pelos contribuintes (diga-se, batalhados durante anos no Judiciário), e, por consequência oneram em demasiado a atividade empresarial brasileira.

No fim do dia, é bem verdade que a solução não está no retrocesso tecnológico, mas sim no planejamento, construção e implementação mais eficientes de sistemas de tecnologia unificados (quando menos, padronizados) e mais intuitivos a serem utilizados em prol dos interesses de todos os envolvidos (contribuinte, fisco e sociedade).

As novas tecnologias devem ser criadas e implementadas a favor de ambos os lados. Seja do lado do Fisco, para maior controle e eficiência na cobrança e fiscalização tributária, quanto do lado dos contribuintes, que esperam que suas obrigações fiscais sejam simplificadas, com bases de dados unificadas e sistematizadas possibilitando a apuração e pagamento de seus débitos, bem como levantamento de seus créditos tributários, amenizando-se o atual trabalho excruciante em razão da perpetrada complexidade.