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Negócios & Transações

"Há um interesse crescente por parte de investidores internacionais em projetos sustentáveis"

Guillaume Légaré é o Head South America da Toronto Stock Exchange & TSX Venture Exchange. Nesta entrevista, ele fala sobre os investimentos em ativos verdes, iniciativas de transição energética e o mercado brasileiro de mineração

Como você avalia o mercado brasileiro de mineração e energia atualmente?

O Brasil possui uma das maiores riquezas geológicas do mundo e uma matriz energética diversificada, com forte presença de fontes renováveis. Isso posiciona o país de forma estratégica na transição energética global, ao mesmo tempo em que a mineração segue sendo um dos principais motores da sua economia, com potencial de crescimento importante.

A Toronto Stock Exchange (TSX) e a TSX Venture Exchange (TSXV) têm desempenhado um papel ativo ao conectar o setor de recursos naturais do Brasil com investidores globais.

Desde 2019, o Grupo TMX decidiu estabelecer presença local no Brasil — somos a primeira bolsa internacional com representação oficial no país. Isso reflete nossa visão de longo prazo e o desejo de aproximar as empresas brasileiras da nossa plataforma, que combina acesso ao capital com conhecimento profundo dos setores de mineração e energia.

Em 2024, as nossas bolsas:

  • Lideraram todos os mercados mundiais em capital levantado para mineração, com mais de CAD 10 bilhões captados;
  • Foram líderes globais em novas listagens no setor, com 52 empresas abrindo capital.

A América Latina representa o mercado internacional mais relevante para a TSX no setor de mineração. Atualmente, temos:

  • 401 empresas de mineração listadas com operações na região, somando 1.039 ativos;
  • Dessas, 32 empresas desenvolvem 92 projetos de mineração no Brasil.

Nosso ecossistema financeiro tem expertise comprovada no setor, o que gera confiança para investidores e empresas. Ao facilitar o acesso ao capital de crescimento, contribuímos diretamente para que o Brasil possa transformar sua riqueza mineral em valor econômico e protagonismo na nova economia verde.

E qual a sua avaliação sobre o nível de maturidade do mercado brasileiro em termos de investimentos verdes?

O Brasil possui ativos naturais de classe mundial e tem avançado no desenvolvimento de projetos voltados à transição energética. No entanto, ainda enfrenta desafios para transformar esse potencial em uma oferta consistente de projetos prontos para investimento, especialmente no caso de empresas menores, como as “juniors” do setor de mineração.

Por outro lado, há um interesse crescente por parte de investidores internacionais em projetos sustentáveis. A TSX se posiciona como uma plataforma estratégica nesse contexto. Com dezenas de empresas listadas nos setores de cleantech e energia renovável, além de índices temáticos e instrumentos financeiros verdes, nossas bolsas têm liderado a captação de recursos para a economia de baixo carbono.

Importante destacar que, embora a TSX não exclua empresas de setores tradicionais como petróleo e gás, os critérios de investimento evoluíram. Hoje, para acessar capital, empresas precisam:

  • Ter escala, para garantir liquidez;
  • Ser lucrativas e com capacidade de distribuir fluxo de caixa;
  • E possuir uma estratégia ESG integrada ao plano de negócios.

Sem esses três pilares, torna-se muito difícil acessar o capital institucional, que adota os Princípios para o Investimento Responsável (PRI) da ONU. Nesse cenário, a TSX e a TSXV oferecem ao Brasil uma plataforma robusta e já testada para atrair o capital necessário à sua liderança na transição energética.

Como tem sido o processo de dupla listagem de empresas brasileiras na bolsa de Toronto?

 Em outubro de 2024, assinamos um Memorando de Entendimento (MoU) com a B3, com o objetivo de ampliar as oportunidades de mercado de capitais para empresas brasileiras. A iniciativa busca integrar o ecossistema da TSX/TSXV com a base de investidores e reguladores locais, em áreas como mineração, energia e energias renováveis. A nossa intenção seria comunicar uma solução viável e inovadora para o mercado brasileiro nos próximos meses.

Conectar os mercados canadenses e brasileiros e nosso principal objetivo, para poder aproveitar experiência e a liderança do mercado canadense. A TSX e a TSXV são líderes mundiais no setor de mineração:

  • 1.113 empresas de mineração listadas globalmente;
  • 33% do capital global de mineração captado entre 2020 e 2024 foi feito em nossas bolsas;
  • 42% de todas as empresas públicas de mineração do mundo estão listadas na TSX/TSXV.

Um diferencial importante é o nosso modelo em dois níveis: empresas iniciam na TSXV, captam recursos de forma eficiente e, conforme ganham tração, fazem a graduação para a bolsa principal TSX. Isso é comum — 54% das empresas de mineração hoje listadas na TSX começaram na TSXV.

Com o apoio institucional certo e acesso a capital internacional, o setor mineral brasileiro pode se posicionar como protagonista global. Nosso compromisso com o Brasil é de longo prazo: queremos apoiar o fortalecimento do ecossistema local e a integração com os mercados internacionais de capital.

Quais as principais diferenças culturais no ecossistema de investimentos você observa no Brasil comparado à realidade canadense?

 No Canadá, o mercado de capitais é uma ferramenta consolidada de financiamento, especialmente para setores como mineração, energia e inovação. Existe uma cultura forte de investimento de risco, com a participação ativa de investidores institucionais e pessoas físicas.

A TSX Venture Exchange, por exemplo, foi construída com o apoio massivo de investidores “retail”, que desempenharam papel fundamental no desenvolvimento do nosso ecossistema e da nossa bolsa de capital de risco TSXV. Essa mentalidade ainda está em fase de consolidação no Brasil, mas os sinais são promissores: o número de CPFs na bolsa tem crescido de forma significativa, o que pode transformar o ambiente de investimento nos próximos anos, criando mais oportunidades para empresas em fase inicial.

O mercado canadense também oferece um ambiente regulatório previsível e uma base de investidores com experiência em commodities e projetos sustentáveis. Isso cria as condições ideais para que o Brasil se beneficie de uma integração mais próxima com os mercados globais de capital.